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MG É O 2º ESTADO COM MAIS MEMBROS DO PCC

Com 4.000 integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) listados pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP), Minas Gerais pode ser considerada a “segunda casa” da organização, um dos maiores cartéis de drogas do mundo. Para piorar a situação, os criminosos, que surgiram e costumam arregimentar “soldados” no sistema carcerário, encontram o caminho livre para a criação de uma verdadeira “central telefônica” nos presídios mineiros, já que só uma das 182 unidades prisionais do Estado conta com bloqueador de sinal de celular.

Para se ter ideia, São Paulo, Estado que foi berço do “Sindicato do Crime”, teria entre 12 mil e 15 mil membros, enquanto, em todo o Brasil, a estimativa do MPSP é que existam aproximadamente 40 mil pessoas envolvidas. Com isso, Minas estaria abrigando em 2023, quando a organização completou 30 anos, cerca de 10% de todos os seus membros.

Em 2018, durante o chamado “Salve Geral” – ataques ordenados de dentro dos presídios pelo PCC -,  Minas e o Rio Grande do Norte registraram uma série de atentados. Na ocasião, pelo menos 50 ônibus foram queimados nas regiões Sul e Triângulo Mineiro.

Retirada de bloqueadores

Há cinco anos, existiam cinco unidades prisionais equipadas com bloqueador de sinal de celular. De lá para cá, quatro deles acabaram sendo desativados, restando, conforme a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), apenas o equipamento instalado no Complexo Penal Público-Privado (PPP), localizado em Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte.

A secretaria argumenta que a desativação dos dispositivos ocorreu devido ao rápido avanço das tecnologias de rede de celular. O que, conforme a pasta, acaba aumentando o custo dos equipamentos sob rápida obsolescência, sendo, então, uma opção desvantajosa para os cofres públicos e para o cumprimento de sua função.

O único equipamento instalado, inclusive, está em uma unidade prisional da Grande BH onde o PCC teria pouca influência. Ludmila Ribeiro, professora do Departamento de Sociologia da UFMG e pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), explica que a facção encontra dificuldade para se fortalecer na região metropolitana principalmente por causa da perda do chamado “poder de matar”, já que conflitos com outros criminosos precisam ser levados para os líderes da facção.

Atuação no Triângulo e no Sul de Minas

“Já no Triângulo e no Sul de Minas, as nossas pesquisas mostram que as pessoas são muito vinculadas quase a uma ideia de ‘ser paulista’, por conta da proximidade. Portanto, elas estão mais suscetíveis a essa ideia de que, se não tiver morte, não vai chamar atenção da polícia e o lucro será maior. Por isso, temos uma maior expansão, maior presença do PCC nestas regiões”, detalha a pesquisadora do assunto.

Apesar disso, nenhuma das cadeias dessas duas regiões mais afetadas pelo “Comando” tem o dispositivo. O Complexo Penitenciário Nelson Hungria, em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, já teve uma ala para o PCC. O presídio foi um dos que tiveram o dispositivo retirado desde 2018, e a Penitenciária de Francisco Sá, no Norte de Minas, que é a única apontada como de segurança máxima no Estado, também não conta com o bloqueador.

Segundo ex-PCC, bloqueadores nunca funcionaram

Apesar do objetivo de que os bloqueadores reduzissem o comando da criminalidade de dentro das cadeias, segundo Marcos*, ex-integrante do PCC entrevistado pela reportagem na última semana, os equipamentos nunca impediram a ação dos criminosos encarcerados.

A pesquisadora Ludmila Ribeiro corrobora a declação da fonte. “Basta você ver os presídios federais, que têm toda uma estrutura tecnológica e, ainda assim, as informações circulam. A informação circula, seja por pessoas dos serviços de manutenção e limpeza ou por meio de policiais corruptos, que são os mesmos que deixam entrar o celular, um problema muito mais dramático”, argumenta.

Questionada sobre a possibilidade de policiais penais facilitarem o acesso e o uso de aparelhos telefônicos nas penitenciárias, a Sejusp informou que não compactua com desvios de conduta. “Todas as medidas são tomadas quando há o conhecimento de supostas práticas irregulares por parte dos seus profissionais – esta é, inclusive, uma das prioridades da gestão da Sejusp: o combate à corrupção”, finalizou a secretaria.

Dispositivo afeta vizinhança dos presídios

Desde 2007, há a discussão de leis que determinem prazos para a instalação de bloqueadores de celulares em presídios. No entanto, desde 2021, o tema está parado no Congresso. Existe uma lei federal que estabelece o uso dos equipamentos, porém o texto não estipula prazos para a implantação.

A Sejusp argumenta que a remoção dos bloqueadores ocorreu por causa da interferência dos dispositivos nos celulares das pessoas que moram perto de presídios, “ocasionando transtornos àqueles que moram próximo às unidades – principalmente aquelas unidades localizadas em áreas urbanas”.

Doutoranda em sociologia pela UFMG e pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), Isabela Araújo também destaca a discussão em torno dos bloqueadores e sua interferência sobre as comunidades do entorno das unidades prisionais.

“Tem uma interferência em um raio de pelo menos 1 km, não existe a possibilidade de bloquear só dentro da unidade. Também há a informação de que ele pode prejudicar a comunicação via rádio, que é como os próprios policiais penais se comunicam dentro das unidades prisionais”, pondera a pesquisadora.

Por nota, a Sejusp destacou ainda que a Polícia Penal do Estado conta com profissionais preparados para fazer revistas de rotina, para retirar celulares e drogas das unidades prisionais, como para impedir a entrada desses materiais. “Para isso há a utilização de scanner corporal, esteiras de raio-x, atividades da área de inteligência, rastreamento aéreo por meio de drones, ações rotineiras de rastreamento por meio do Grupamento de Operações com Cães, entre outros”, completa a secretaria.

Definição sobre política de drogas determinará futuro da facção

Questionado sobre o que poderia levar ao fim do PCC, o procurador Márcio Sérgio Christino, do MPSP, que também é autor do livro “Laços de Sangue: A História Secreta do PCC”, disse duvidar que a organização criminosa deixe de existir. Segundo ele, o Brasil precisa pensar em definir o que quer com relação às drogas.

“O PCC é tráfico. Enquanto ele for fomentado, ou for combatido, é a mesma medida de força que eles vão ter. Nós vamos liberar as drogas? Ótimo, mas só se tiver o fornecedor. Se isso não ocorrer, estaremos dizendo aos criminosos: sejam bem-vindos. Mas o que for decidido com relação à política de drogas vai decidir o futuro do PCC e das outras facções”.

Promotor de Justiça do MPSP e coordenador do livro “10 Anos da Lei das Organizações Criminosas: Aspectos Criminológicos, Penais e Processuais Penais”, Fábio Ramazzini Bechara argumenta que, apesar de importante a discussão sobre a descriminalização das drogas, ele não acredita que isso possa levar a um enfraquecimento da facção criminosa.

“O criminoso busca a oportunidade dentro de um ambiente para explorar atividades que sejam economicamente ilícitas. Portanto, eu diria que, em uma situação como essa (descriminalização), no final teríamos uma migração de determinado tipo de atividade ilícita para outras”, ponderou.

Já a pesquisadora Isabela Araújo, da UFMG, concorda que a regulamentação estatal do consumo das drogas é uma forma de diminuir o poder do PCC. “Sociólogos, advogados, criminalistas sempre discutem soluções, e elas sempre esbarram no encarceramento em massa, e só uma discussão muito séria sobre isso poderia resolver”, disse a estudiosa do assunto.