MINAS IRÁ PRODUZIR INSUMOS PARA VACINA CONTRA A COVID
A pandemia da COVID-19 expôs que a produção do insumo farmacêutico ativo (IFA) é um dos principais obstáculos para a ciência brasileira avançar no combate a doenças. Depois que farmacêuticas multinacionais anunciaram as primeiras vacinas contra o Sars-Cov-2, neste primeiro momento, o Brasil enfrentou dificuldade na importação dessa matéria-prima para os imunizantes. No entanto, a boa notícia é que Minas terá um laboratório para a produção do IFA, no Centro Nacional de Vacinas que será construído em terreno de 4.400 metros quadrados no Parque Tecnológico de Belo Horizonte (BH-TEC), instituição que tem a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) como sócia-fundadora e parceira estratégica. Toda a obra está orçada em R$ 80 milhões.
Minas ficará em pé de igualdade com a Fiocruz, que, na primeira semana de janeiro, recebeu o aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a produção de IFA, permitindo assim a produção da primeira vacina contra a COVID-19 totalmente nacional. Vale lembrar que os laboratórios de Manguinhos, da Fiocruz, e o Instituto Butantan tiveram papel fundamental na produção das doses, que foram desenvolvidas por farmacêuticas em parceria com grandes universidades do mundo.
Do aporte de R$ 80 milhões para o CN Vacinas já chegaram os R$ 18 milhões, repassados pela Secretaria de Estado da Saúde, em 29 de dezembro, valor que permite o início das obras em fevereiro. O centro representará uma independência tecnológica que também traz ganhos econômicos para o país, além dos benefícios sanitários. “O CN Vacinas coloca Belo Horizonte na liderança do país para vacinas”, afirma o pesquisador Ricardo Gazzinelli, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) e do CT Vacinas. O centro de pesquisa em vacinas é vinculado à Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
O mundo passa por um processo de revolução na produção de vacinas decorrente do aparecimento da COVID-19, pandemia que demonstrou que a qualquer momento pode surgir novo vírus letal para a humanidade, além das variantes para os vírus já em circulação. “A cada minuto você terá que desenvolver uma vacina nova. O exemplo é a Ômicron. As vacinas existentes ajudam a atenuar a doença, mas não a infecção. Teremos que ter opção de vacinas para variantes, como temos para a vacina da gripe, que, a cada ano, você tem que ter uma formulação diferente.”
Um ano depois de o CT Vacinas ser inaugurado, em 2016, a UFMG iniciou a elaboração de plano estratégico para a ampliação. O objetivo, naquele momento, foi sanar uma deficiência no Brasil: absorção de tecnologia de diagnóstico e de um tipo de laboratório que o país é dependente do exterior. O laboratório para a produção do IFA deverá ocupar dois andares do CN Vacinas.
O laboratório terá capacidade para produzir o insumo essencial para realizar os ensaios clínicos e também os lotes-piloto. Com o desenvolvimento dessa tecnologia, a indústria farmacêutica poderá, futuramente, produzir em larga escala o IFA, que, atualmente, tem que ser importado.
Salto tecnológico Com esse laboratório, o Brasil dará um salto no desenvolvimento de vacinas com tecnologia nacional. O país ainda não desenvolveu nenhuma vacina e todas que fazem parte do Programa Nacional de Imunizações (PNI) são produzidas com base em tecnologia importada. “As nossas fábricas produzem o IFA, mas elas não são oriundas de tecnologia nacional.”
Um protocolo de intenções foi assinado entre a UFMG, governo de Minas, Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) e o BHTec para criação do CN Vacinas, que deverá ser inaugurado em 30 meses, em meados de 2024. Em dezembro, foi assinado convênio para repasse de R$ 50 milhões pelo ministério, R$ 18 milhões da Secretaria de Estado da Saúde e R$ 12 milhões da Fapemig. Em 29 de dezembro, a SES enviou a parcela de R$ 18 milhões.
Atualmente, o CT Vacinas desenvolve a SpiN-TEC, contra a COVID-19, além de vacinas contra a leishmaniose, malária e doença de Chagas. O foco inicial do Instituto Nacional de Vacinas, de onde o CT Vacinas é oriundo, eram as doenças negligenciadas, doenças que atingem a população mais carente. Com a pandemia, o Centro Nacional de Vacinas continuará a desenvolver vacinas para doenças negligenciadas, mas também se dedica à pesquisa para infecções virais e epidemias com potencial para pandemias.
CN Vacinas O CN Vacinas receberá os laboratórios do CT Vacinas, que serão expandidos, além de ganhar novos equipamentos. Atualmente, o CT Vacinas conta com quatro laboratórios: biologia molecular, bioquímica e proteína, prototipagem de diagnóstico por Elise, e prototipagem de diagnóstico teste rápido, e laboratório de prestação de serviços, que realiza testes para a Fundação Ezequiel Dias (Funed). O CN Vacinas terá uma área de testes pré-clínicos, biotério, um andar que será alugado para indústrias que quiserem desenvolver projetos na área de insumos e vacinas, e laboratórios, em dois andares, dedicados à produção do IFA.
Os pesquisadores devem concluir, ainda em janeiro, os testes pré-clínicos da SpiN-TEC. Com a aprovação da Anvisa, os cientistas seguem para o teste clínico, dividido em três etapas. Nas fases I e II, a candidata a imunizante será aplicada em 400 voluntários. Se tudo correr bem, o número de voluntários será ampliado. Ricardo Gazzinelli lembra que, se o desenvolvimento avançar, o MCTI pode financiar a fase III da SpiN-TEC, quando é feito o estudo de eficácia. Nas primeiras vacinas para a COVID-19, foram vacinados cerca de 30 mil voluntários.
No entanto, como no momento atual boa parte da população brasileira já foi imunizada, os cientistas devem calcular qual o número de voluntários será necessário, que pode variar de 5 mil a 30 mil. “Existe uma dificuldade de definir neste momento. Vai depender do contexto do momento”, diz o o coordenador do CT Vacinas.
O Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI) financia 15 projetos, em todo o Brasil, para a produção de vacinas. Quatro estão mais adiantados, entre eles o da SpiN-TEC, candidata a vacina contra a COVID-19 desenvolvida no CT Vacinas.