UFMG PESQUISA RELAÇÃO DO EVANGÉLICO E O MERCADO DE TRABALHO
Desde os anos 80, nenhuma outra religião cresceu tanto no Brasil quanto a evangélica — ela passou de 6% da população, naquela década, para pelo menos 22%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse crescimento não altera somente a concentração das religiões no país, que tem cada vez menos católicos, mas chega também ao mercado de trabalho.
A dinâmica da empregabilidade entre evangélicos tem particularidades que podem ampliar indicações e abrir portas a vagas — nem sempre bem-remuneradas. Estas são algumas das recém-publicadas conclusões de pesquisadores de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Um dos autores do estudo, o professor Jorge Alexandre Neves, introduz que o assunto é discutido há mais de um século, citando um livro clássico da área, “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, do alemão Max Weber. “Na sociologia, há historicamente uma relação entre protestantismo e economia”, diz. A pesquisa da UFMG avaliou o perfil de 900 pessoas evangélicas em três capitais do Sudeste: Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo.
Uma das conclusões é que o esterótipo de que religiosos dessa vertente sejam honestos pode ajudar grupos minorizados, como mulheres e negros, a diminuir resistências no mercado de trabalho. “O empregador enxerga o evangélico como alguém mais confiável, que não bebe e tem responsabilidade. Ser evangélico ‘apaga’ ou reduz a discriminação pela pessoa ser negra, por exemplo. É a teoria dos rótulos”, continua o pesquisador. Ele também destaca que, mesmo em igrejas com forte viés patriarcal, há espaço para empoderamento financeiro das mulheres, em alguns casos estimuladas a trabalhar para contribuir com a comunidade.
Além da percepção do empregador, as igrejas evangélicas formam uma rede de indicações essencial especialmente para a população de baixa renda, acrescenta outro dos autores da pesquisa, o professor Silvio Salej — além dele e de Neves, Luciano Mattar assina o estudo. “A religião evangélica tem um perfil muito claro. É uma religião majoritariamente de extratos populares, ainda que haja ricos também. Nesse segmento de renda mais baixa, as igrejas operam como formadoras de uma rede de contatos muito eficaz. Ao contrário do que podemos pensar no mundo digital, o boca a boca continua a ser um mecanismo muito útil”, diz.
A questão é que os trabalhos obtidos dessa forma tendem a ter baixa remuneração. “Não podemos pensar que só pelo engajamento religioso as pessoas terão postos de trabalho mais altos, se a educação não fizer a parte dela. A religião está construindo um dinamismo importante no mercado de trabalho, uma rede de proteção. Mas há um teto educacional e macroeconômico”, continua Salej.
Os pesquisadores defendem que a religião se torne um indicador habitual dos levantamentos sobre o mercado de trabalho no Brasil. “O país ainda tem o maior número de católicos do mundo, mas isso vem mudando de forma dramática, e o Brasil se tornou um país plurirreligioso”, conclui o pesquisador.