IDOSA É RESGATADA DE TRABALHO ESCRAVO EM MG
Durante 32 anos, uma mulher trabalhou quase sem remuneração para uma família de Nova Era, na região Central de Minas Gerais. “Ela teve uma vida roubada”, relatou uma das auditoras-fiscais que “libertou” a vítima, que hoje tem 63 anos. A fiscalização ocorreu entre os dias 5 e 7 de julho. Cynthia Mara da S. A. Saldanha, acompanhada de outras duas colegas de profissão, encontraram a idosa trabalhando quando chegaram ao local da denúncia anônima. Ela cozinhava, lavava, e fazia todo o resto do trabalho doméstico para o empregador e a família — um homem de 47 anos e para os pais dele (a mãe de cerca de 70 anos, e o pai de aproximadamente 90). “A mãe nos disse que ela (a idosa) era dela”, revelou Cynthia. O pagamento só ocorreu no início do trabalho, depois o o dinheiro “virou” comida e casa.
Conforme a auditora-fiscal, a vítima chegou ao local quando os três filhos do casal de idosos ainda eram pequenos. Na época, a mãe deles estava adoentada e precisava de ajuda para realizar as tarefas domésticas. O tempo foi passando e os filhos saíram de casa, exceto o empregador, que manteve a trabalhadora.
A idosa cuidava de duas casas. Em cima, morava o homem. No andar debaixo, vivia o casal e a empregada. Ela dormia em um corredor, sem qualquer privacidade. “O quarto dela era um local de passagem. E, na casa, havia mais um quarto com duas camas”, detalhou a auditora.
Afeto pelo empregador
As auditoras chegaram à residência da família denunciada com o reforço da Polícia Militar (PM) e do Ministério Público do Trabalho. O isolamento da idosa naquele mundo era tão grande que, mesmo sem receber salário, ou qualquer direito trabalhista, ela demorou um pouco a entender a situação em que se encontrava. “As vítimas (desse tipo de crime) geralmente desenvolvem um afeto pelo empregador, o que dificulta a denúncia por elas mesmas”, explica Cynthia.
Além disso, a idosa está em uma situação vulnerável, já que não tem amigos e sofre de problemas psiquiátricos. E tinha pouco contato com a família. Ela namorou apenas uma vez, aos 16 anos, e está solteira desde que começou a trabalhar na casa da família.
Ela estudou até a quarta série, depois, conforme o próprio empregador disse às auditoras: “como ela não estava aprendendo nada, achou conveniente que ela ficasse em casa, sem estudar”.
Aposentadoria era retida pelo ‘patrão’
Além de não arcar com os direitos da trabalhadora, o empregador ainda disse que “administrava” a aposentadoria da mulher. “Ele contou que o dinheiro era revertido em benefício dela, mas ele não apresentou argumento do que fazia com o dinheiro. Até os medicamentos dela, são do posto”, revelou a auditora.
“Mais uma vez nos deparamos com caso em que a pessoa não paga salário e/ou qualquer direitos trabalhistas sob a alegação de que ‘é da família’. Esta falsa ideia de inserção familiar ou ilusão de pertencer à família é usada como artifício para justificar o não pagamento de salários ou a não concessão de direitos trabalhistas. Essa lógica da ‘parentalidade’ serve para mascarar uma relação de trabalho existente”, acrescentou.
O trabalho ilegal foi interrompido, e a mulher resgatada. O Ministério Público do Trabalho vai fazer um levantamento e entrar com uma ação judicial para que a idosa receba o que lhe é devido. Além disso, o empregador vai responder criminalmente por reduzir alguém à condição análoga à escravidão, quem pena de 2 a 8 anos de prisão e multa.
As auditoras fiscais entenderam que os parentes poderiam cuidar da mulher, que estava há anos afastada do convívio familiar. A assistência municipal de Nova Era faz o acompanhamento.
Importância de denunciar
A auditora Cynthia Mara da S. A. Saldanha pede que, todas as pessoas, que perceberem situações análogas à escravidão denunciem os casos. As denúncias podem ser feitas à Secretaria de Inspeção do Trabalho: https://ipe.sit.trabalho.gov.br